A rua da casa da minha avó em Minas só ganhou calçamento quando eu já era quase adulto – hexágonos de cimento ou de concreto mal sapados (a grama crescia livre em seus vãos). Quando eu era menino, tudo era terra, tudo era de terra.

Eu me esbaldava num barro claro com muita mistura de areia. Em janeiro a água das chuvas corria muito limpa sobre a sílica que faiscava sobre essa lama clara. Eu ficava até os tornozelos naquilo, cavando, esperando achar uma moeda romana, um osso de dinossauro, o baú de um pirata. Eu era como Alice: solitário e fervilhante.

À tardinha, cansado, me sentava no alpendre e via procissões de mulheres negras que falavam alto e riam muito. Se uma me sorrisse, eu abaixava a cabeça, envergonhado; às vezes, tinha vontade de fugir.

Na torre da igreja havia um alto-falante que, às seis da tarde em ponto, todo sábado, tocava o “Tema de Lara”. Fazia calor; um silêncio se esticava como elástico até que as pessoas começassem a sair de suas casas e fossem à praça. Eu entrava para jantar vendo um céu imenso pelo janelão da cozinha, e deixava de me perguntar muitas coisas, absorvido.